A resposta que dei ao João Rodrigues fez-me reflectir melhor sobre o que penso desta greve do sindicalismo actual. Por isso decidi aqui desenvolver um pouco a resposta.

Os sindicatos, ainda muito divididos por profissões, estão pouco adaptados a este mundo em que uma pessoa faz 6 meses isto e 4 aquilo, passando de bancária a professora ou atendedora de telefones num call center. Por outro lado, não se conta com os recibos verdes ilegais que por aí polulam: gente com um emprego e um posto de trabalho, mas sem direito à greve (e a mais uma mão cheia de coisas). A base de representatividade dos sindicatos diminui à velocidade mesma com que cresce o número de recibos verdes ilegais.

Quanto à organização das greves em Portugal, não vejo por parte da CGTP e dos restantes organizadores um plano de luta bem delineado. Algo que diga ao governo que a luta vai seguir até eles cederem. O que se passa habitualmente e que tudo indica vai passar-se hoje também, é que se cumpre um diazinho de greve, perde-se um dia de salário, o patrão não tem produção nesse dia, mas também não tem custos; na tv há um debate sobre os reais números da greve e pronto: quinta-feira tudo igual.

No manifesto, a CGTP faz diversas exigências, todas muito justas. Mas sem especificidade. “Basta de precariedade” está certíssimo, mas falta dizer como e o quê. Ou seja, falta uma verdadeira base de negociação para exigir negociar com o governo, dizendo claramente o que é negociável e o que não é.

O governo aparecerá às 20h nas tvs a reagir à greve: desde ontem já deveríamos saber quando é que os convocadores da greve se reunirão para reagir às declarações do governo. E se pusermos a hipótese (muito provável) de o governo não recuar já, essa reunião tem que decidir também qual a próxima forma de luta.

O governo e o patronato deveriam ser devidamente informados de que têm que ceder sem outra hipótese. Seria preciso que soubessem que à falta dos assalariados também não poderiam recorrer aos recibos verdes, por estes estarem também protegidos pelos sindicatos.

Claro que para isso seria necessária uma outra organização e filosofia de funcionamento dos sindicatos, nomeadamente na constituição de fundos de greve.

Dessa forma, e debaixo de intensas pressões, o governo ver-se-ía certamente obrigado a repensar a sua estratégia e teríamos o enorme gozo de ver o Sócrates nas televisões a fazer a sua declaração de recuo em relação à Flexigurança ou ao congelamento das carreiras, por exemplo.

Com esta greve, o governo e o patronato sabem que quinta-feira está já à porta e que na sexta já ninguém sequer fala do assunto.